quinta-feira, 9 de junho de 2016

O FASCÍNIO DE ESCREVER, COMO CONSEQUÊNCIA DO LER



Pe. José Neto de França Sacerdote e escritor

Todos nós temos uma história particular, história essa que está intrinsicamente ligada à história de nossa família, comunidade, município, estado, país, universo.... Também ela está impregnada da religiosidade ou não que abraçamos ao longo de nosso existir.

Essa história foi sendo construída desde o ventre materno (não levando em consideração as questões genéticas que trazemos de nossos antepassados).

A arte de se comunicar foi e continua sendo fundamental para a construção do histórico de nossa vida.

O ser humano, diferentemente dos outros seres criados, necessita dessa comunicação. Somente o ser humano se dá conta de que o mundo se comunica, de algum modo, com ele. Ele e seus semelhantes se comunicam entre si e, por que não, ele se comunica com ele mesmo.

É justamente que, a partir daí, se dá conta de que não vive sozinho, mas em sociedade, no sentido de que precisa do próximo, independente de quem seja este próximo, além da necessidade de não somente gerar, mas fazer parte da própria cultura. Também sente a importância de pensar não somente no “eu”, mas também no “outro” formando um “nós” onde o compromisso ultrapassa o limite do individual para mergulhar no coletivo.

Desta forma, tudo que faz tende à promoção sociocultural-religiosa. O bem que queira ao outro é seu próprio bem, como o mal que faça ao outro é seu próprio mal; a alegria do outro é a sua alegria; a felicidade, a vitória do outro é também a sua felicidade, vitória...

Ainda nessa perspectiva, pensar, formar juízos, mesmo no chamado “senso comum” é comum a todos os seres humanos. Transformar a realidade em pensamento e pensamento em escrito é mais restrito. Por quê? Justamente pelo fato de que, se o homem não exercita seu pensar, “mergulhando” nos acontecimentos do quotidiano da vida, na cultura universal, certamente restringe seu universo cultural, limita seu raciocínio lógico, forçando sua permanência na superficialidade do mundo interior e exterior. E, se não instiga seu pensar, está fadado a grandes perdas.

Os tipos de comunicação são diversos. Detenho-me aqui, de uma forma toda especial, na comunicação falada e escrita. São tipos de linguagens diferentes. O falar, mesmo quando culto, carrega um pouco de “coloquialidade”. São ordens, pedidos, conversas, debates, discussões, formalidades, informalidades... Já a linguagem escrita, deve obedecer determinados critérios, dependendo do estilo de texto, como por exemplo: linguagem técnica, narrativa, discursiva, literária, jornalística, etc.

Acredito, por experiência própria, que, se desde a mais tenra idade o homem for direcionado, educado, entre tantas coisas, na leitura, este não somente refinará seu pensar, como seu falar e, sobretudo, seu escrever.

Quem não tem o hábito de ler, tem uma grande dificuldade de interpretar e, mais ainda de produzir um texto, por menor que este seja. Estudar gramática e não criar o hábito de ler é como aprender uma língua estrangeira e não exercitá-la. Uma vírgula, um ponto ou ponto e vírgula, um acento desconsiderado pode ser um desastre na interpretação de um texto. Isso porque o “leitor” pode forçar o texto a “dizer” o que ele não diz.

Com a graça de Deus, faço parte daqueles que, dentro dos meus limites, tenho condições de produzir textos. Como começou?

O ensino vigente no meu período de infância e adolescência, na década de sessenta e início de setenta, priorizava a leitura. Ditado, leitura em voz alta, tanto de palavras soltas, como de frases inteiras, redação, caligrafia eram atividades frequentes em salas de aula, somando-se a isso as diversas atividades denominadas “lições de casa”. Também tive a graça de ter professoras/es que me incentivaram a ler. Além de ser cobrado não somente na escola, mas também no seio familiar.

Ainda adolescente, tendo acesso fácil à Biblioteca municipal de Santana do Ipanema, li praticamente todos os livros infanto-juvenis, além de clássicos da literatura universal como “Os Lusíadas” de Camões e “A Divina Comédia” de Dante Alighieri. Tive acesso a dezenas de livros de estórias em quadrinhos ou mesmo de outras obras voltadas para adolescência e juventude da época. Viajei por lugares longínquos, visitei países reais e imaginários, ultrapassei o universo... Tudo através da leitura.

Junto ao hábito de ler, nasceu também em mim o de “imaginar”. Este foi um segundo momento. Foi como que uma “ponte” para desenvolver e chegar ao ato de escrever.

Quando não tinha as chamadas “lições de casa”, ou mesmo, quando espontaneamente já tinha revisto alguma matéria que fora ministrada na sala de aula, ou ainda finalizado alguma pesquisa de meu próprio interesse, reservava um momento no dia para “imaginar”. Logicamente que, na origem desse “imaginar”, estavam as estórias e história da vida.

Fazia isso de duas formas: retirava-me, normalmente no meio da tarde ou à noite aos meus aposentos, deitava, procurava me desligar do mundo real e mergulhava no imaginário. Ali “inventava” estórias de todos os estilos, seguindo a idade em que me encontrava. Fui mocinho e bandido; protagonista e antagonista; por vezes mero narrador... Normalmente eu acabava adormecendo no “meio” da estória... Era divertido! Era também uma espécie de terapia. Fazia-me um bem imenso. Nessa fase, meu imaginar centrava na ficção, embora em certos momentos introduzia personagens e situações “reais”.

Nesse período, ainda não estava preparado, pelo menos não pensava em escrever.

Terminando a adolescência, indo residir na capital paulista por doze anos e retornando à minha terra natal, muita coisa mudou. O estilo de vida numa cidade com um acesso cultural bem mais amplo e uma vontade de “conhecer”, cada vez mais, muita leitura; a experiência de vida acumulada fez-me mais maduro. Meu universo cultural também.

Os cursos de Filosofia e Teologia que cursei no Seminário Arquidiocesano de Maceió, após minha experiência na capital paulista, foram decisivos para que desenvolvesse e tomasse gosto, fascínio pelo escrever.

1º Livro: Não ser... Ser! Viver: um grande desafio

No meu período acadêmico, compus minhas primeiras poesias. Uma palavra, uma frase que ouvia, fosse em sala de aula, durante uma leitura ou em qualquer lugar... Estas, às vezes, tocavam-me de forma diferenciada, e, em questão de minutos, a poesia estava pronta. Já ordenado sacerdote, fascinado pelo existir humano, continuei a compor.

No segundo semestre de 1995, no meu primeiro ano de sacerdócio ministerial, preparando uma palestra para jovens estudantes, interessei-me bastante pelo tema proposto, “Viver: um grande desafio”. A empolgação foi tanta que, enquanto produzia o texto a ser apresentado, nasceu também a ideia de produzir um livro. Não seria difícil. A primeira parte seria o texto da palestra, em forma de prosa. A segunda parte seria composta de poesias voltadas para o existir humano. A introdução e a conclusão era o de menos. Estava decidido, mas teria que amadurecer um pouco mais.

Passaram-se alguns anos. Já na minha primeira paróquia tomei a decisão final. Convidei o bispo de Palmeira dos Índios, na época, Dom Fernando Iório, para redigir o prefácio. Este, amante da literatura, aceitou de imediato. Tudo pronto, enviei a algumas editoras, como a Paulinas, Loyola, Ave Maria, Vozes, etc, mas não obtive sucesso. Assumir os custos numa editora independente, no momento, era inviável. Suspendi o projeto, mas não a ideia.

No ano de 2008, realizei esse sonho. Convidei o atual bispo de Palmeira dos Índios para fazer a apresentação, e, com a ajuda de amigos, enviei o material a uma editora independente. No dia 21 de junho de 2008, na AABB, em Santana do Ipanema/AL estava lançando meu primeiro livro.

Neste primeiro livro, abordo o fascínio do existir humano onde o homem, tomando consciência de que não é um “acidente”, uma fatalidade, também percebe que, por ser privilegiado por Aquele que o criou, deve exercer seu “existir” dentro de situações concretas, do “aqui”, do “hoje”, como prólogo do amanhã.

            Levo o leitor a perceber que, enquanto ele “está no mundo”, ele simplesmente “é”. Em relação a qualquer que seja o referencial, ele pode existir ou não. Mas em relação a ele próprio, em seu intelecto, suas emoções, paixões, ele só existe verdadeiramente quando é capaz de gerar motivações que dê sentido ao palmilhar de sua existência.

            Faço-o perceber que ele é livre (nenhum ser criado pode impedi-lo) para pensar e refletir. Seu pensamento pode aproximá-lo ou afastá-lo das verdades (conhecimento dos outros seres) ou da Verdade Suprema: Deus. Faço-o “ver” que pensar bem é uma virtude. A meditação, fruto de um reto pensar, leva o homem ao refinamento de seu espírito.

2º Livro: Paróquia de São Cristóvão: Panorama Histórico pastoral

            Neste segundo livro, traço um “panorama histórico-pastoral” sobre a paróquia de São Cristóvão de Santana do Ipanema/AL

            Nasceu a partir de uma pesquisa feita em cada comunidade da paróquia. Queria saber o que o povo dizia sobre a origem de cada comunidade e como ela se encontrava no momento presente.

            Ele foi lançado no dia 26 de fevereiro de 2011 durante o último encontro de comunidades realizado por mim na dita paróquia enquanto fui pároco dela.

3º Livro: Fragmentos de mim

Fragmentos de mim” é o meu terceiro livro, onde sigo uma linha semelhante ao primeiro, intitulado “Não Ser... Ser! Viver: um grande desafio”.  Nele, com um matiz existencial/contemporâneo/cristão, manifesto um estilo poético filosófico.

 Fragmentos de mim” retratam momentos do outro e de mim. De mim porque procuro “construir” com palavras o que meu existencial está vivendo em momentos específicos de minha trajetória na linha do tempo e do espaço. Do outro, porque o que vivo reflete, em parte, o que absorvo do meu convívio na sociedade fazendo com que, quem quer que seja o outro, também se identifique com o que manifesto.

            Seu lançamento aconteceu em Santana do Ipanema, no dia 23 de agosto de 2013.

4º Livro: Desafios da fé

Em meio a tanto do que já se falou ou se fala diariamente em questão de fé, “Os desafios da fé” é, assim, uma coletânea de textos independentes, que tem como pretensão levar o leitor à reflexão desse tema, numa perspectiva cristã em relação a si mesmo, ao outro e a Deus.

            Entre tantas vertentes presentes na vida do homem, está a dimensão da fé. Esta, independentemente de qualquer tendência social, marca profundamente seu existir; mais ainda, norteia sua própria história.

            O homem, por sua própria essência, está sempre crendo em alguma coisa: no outro, em si mesmo, em Deus... Dizer não acreditar em nada é contradizer a si próprio.

            Lançado, em Santana do Ipanema no dia 14 de agosto de 2015.

5º Livro: Retalhos da vida

Nesta obra, abordo, de forma poética, além de momentos, “retalhos” do meu existir, temas como política, natureza, religiosidade ou mesmo abstrações diversas; algumas, enigmáticas; coisas da vida! Em um interessante jogo de palavras dou sentido à “vida”, extrapolo a arte, coloco-me para fora, torno-me conhecido um pouco de mim mesmo. Faço uma espécie de catarse onde alivio o “peso do existir”, as pequenas e grandes coisas que povoam minha memória.

            Procuro fazer o leitor identificar-se com cada palavra, poesia; sentir também a necessidade de descobrir a si próprio e em si mesmo, como pessoa e como parte da sociedade, sentimentos, às vezes, adormecidos pelo não exercício do pensar.

            Lançado, simultaneamente com “Os desafios da fé”, em Santana do Ipanema no dia 14 de agosto de 2015.

- CD: Pensar: Por que pensar?

            São apenas sete poesias retiradas de sua primeira obra, “Não Ser... Ser! Viver: um grande desafio” e musicadas pelo Pe. Antônio de Pádua Santos Sobrinho e por ele. Cada música, por ele interpretada, é iniciada com um pequeno comentário objetivando a reflexão do ouvinte.

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            A minha formação cristã, familiar e acadêmica fez-me desenvolver um estilo próprio.

No geral, não me prendo a nenhuma corrente especificamente. Tenho minha forma de pensar, enxergar o mundo. Procuro ver o outro, o cosmo, a mim mesmo de diversos ângulos, tirando conclusões, mesmo provisórias, já que a existência está em constante “devir”.

Compondo sem me preocupar com métrica ou rima, "truncando" palavras, omitindo na maioria das vezes artigos, pronomes, verbos; "jogando" muito frequentemente com os "contrários", provoco intencionalmente o leitor, numa tentativa de fazê-lo despertar para a vida, seja intelectual, seja existencial. Vejo também no "outro", motivação para "olhar" para mim mesmo... Nesse “jogo” de olhar, ver, sentir, imaginar, amplio, alargo minha visão do mundo à minha volta; vejo o que uma visão empírica deixaria escapar, não me prendendo à superficialidade nem tampouco estacionando na “locomotiva” da vida.

“Ler” foi para mim a porta de entrada para o universo cultural das letras.

Hoje, após cinco livros lançados, alguns no processo de escrita, já participei de duas Bienais Internacionais do Livro. Sou responsável pela edição, diagramação e direção do Jornal da Diocese de Palmeira dos Índios; tenho vários artigos publicados; fui reconhecido como escritor; faço parte da Academia Santanense de Letras, Ciências e Artes – ASLCA, assumindo a cadeira que tem como patrono o Pe. Francisco José Correia de Albuquerque; faço parte como SÓCIO CORRESPONDENTE da APALCA - Academia Palmeirense de Letras Ciências e Artes; sou membro da AAI - Associação Alagoana de Imprensa, sob nº 659. Além das atividades culturais e de imprensa das quais faço parte, exerço o meu ministério sacerdotal há um pouco mais de 21 anos.

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